Sérgio Biagi Gregório 1. INTRODUÇÃO A finalidade deste estudo é refletir sobre o relacionamento
entre o nosso "eu" e os "eus" de outras pessoas. Pergunta-se: quem é o outro?
Como distinguir o meu "eu" do "eu" dos outros? Que tipo de "outro" estamos sendo
para os "outros"? 2. CONCEITO Outro – Do latim alteru (outro entre dois)
significa diverso do primeiro, diferente de pessoa ou coisa especificada. Para
Sartre, "o outro é o eu que não sou eu". A qualidade das relações que o homem
trava com o outro depende não apenas da simpatia de que é investida, mas também,
do conhecimento recíproco dos protagonistas. 3. PALAVRAS INICIAIS Desde o início da filosofia o problema do outro e do diverso
esteve em destaque. O pensamento de Parmênides era o pensamento do Mesmo
(identificado com o Ser), o de Heráclito parece ter sido o do Outro. Platão
introduziu o Não-ser sob a forma de o Outro. Na filosofia moderna e
contemporânea, o problema do outro indica o problema da existência de outros
eus (espíritos ou pessoas), independentes do eu que formula o
problema. Presentemente, as Universidades e escolas de ensino médio dos EUA
incluem em seus currículos uma disciplina que ensina os alunos a se relacionarem
melhor, especificamente o relacionamento entre casais. Em termos científicos, há
comprovação de que o sofrimento de pessoas queridas pode realmente nos atingir.
Para isso, a University College London, na Inglaterra, avaliou 16 casais,
utilizando uma máquina de ressonância magnética e eletrodos. 4. ALGUMAS POSIÇÕES FILOSÓFICAS 4.1. LEVINAS
É FILÓSOFO DA "ALTERIDADE" Reflete em torno do "Outro". Para ele, o Outro não é o
distante, o estranho, e muito menos o impessoal. O Outro é universo epifânico e
dialogal. O milagre consiste em que um homem possa ter sentido para outro homem.
E valoriza a presença do Outro. Levinas estabelece a relação entre ética e
ontologia. "Ser-Outro é mandamento, é apelo à responsabilidade. É minha
responsabilidade perante a face que me olha". (Arduini, 2002, cap. VIII) 4.2. A CONSPIRAÇÃO DE TEILHARD DE CHARDIN Conspirar é aspirar com os outros. É formar constelação de
agentes em torno de uma causa. Teilhard de Chardin salienta que "conspiração é a
aptidão de diversas consciências que se juntam para construir um Todo, onde cada
pessoa tem consciência de sua participação como todos os outros... Conspiração
de unidades pensantes. É imperioso tecer a rede de solidariedade mundializada. (Arduini,
2002, cap. VIII) 4.3. FICHTE E O DEVER Fichte, em Doutrina Moral (1798), afirma o caráter
originário da idéia do dever, da qual deriva o reconhecimento dos outros eus. A
idéia do dever é a autodeterminação originaria do eu, mas ela não poderia ser
realizada se não existissem outros eus, outros sujeitos em face
dos quais, somente, a idéia do dever pode ter a sua determinação e, portanto,
possibilidade de realização. 5. SOLIDARIEDADE 5.1. QUEM É O OUTRO? O outro retrata a Humanidade, no que ela tem de bom ou de
ruim. Aspectos negativos: o "outro" ocluso é hermético, o
"outro" desconhecido é distante, o "outro" ameaçador inspira desconfiança, o
"outro" prepotente esmaga os subalternos, o "outro" violento é agressivo, o
"outro" egocêntrico encastela-se em seus próprios interesses, o "outro"
constrangedor coage a liberdade e bloqueia a comunicação, o "outro" rejeitado é
discriminado, o "outro" insensível não se abala com a pobreza alheia, o "outro"
traiçoeiro derruba parceiros, o "outro" cínico engana a sociedade. Aspectos positivos: o "outro" diferente revitaliza a
sociedade, o "outro" companheiro caminha conosco por estradas planas e
esburacadas, o "outro" solidário é pessoa com quem se pode contar nas horas de
alegria e de tristeza, o "outro" aliado assume as causas legítimas da justiça, o
"outro" movido pela esperança avança sempre, o "outro" audacioso suscita
coragem, o "outro" honesto não se vende por bagatelas, o "outro" autêntico é
reserva de humanismo, o "outro" fraterno é habitado pela caridade transparente.
(Arduini, 2002, cap. VIII) 5.2. NARCISISMO Narciso vem do grego "Nárkissos". Indica torpor, é
"Narco". Daí o "narcótico". Conta o mito que Narciso era filho do rio
Cesifo e da ninfa Liríope. Narciso não correspondeu
ao amor de Eco. Por isso, Afrodite condena-o a mirar-se nas águas.
Debruça-se sobre o rio e fica encantado com sua beleza refletida na água. Acaba
enamorando-se de si mesmo. Narciso amava a si mesmo e desprezava o amor dos outros.
Narciso sobrevive na mentalidade e nas atitudes das sociedades. Há
setores que estimulam o individualismo psicológico, econômico e social. (Arduini,
2002, cap. VIII) 5.3. A RESPONSABILIDADE Cada pessoa tem a responsabilidade de ser caminho para os
outros. É injusto excluir outros do caminho. Pergunta-se: estamos criando
condições de potencializar o nosso próximo? Predispomo-nos a ouvi-lo com
atenção? E se for um homem iletrado? Temos para com ele o respeito de um ser
humano? A responsabilidade não diz respeito somente ao ser humano,
mas também em relação ao meio ambiente. Hoje, são muitas as empresas que se
preocupam com o que produzem, com o tipo de lixo que estão descartando, com as
condições de trabalho de seus funcionários etc. 6. REFLEXÃO EM TORNO DO EVANGELHO 6.1. PARÁBOLA DO BOM SAMARITANO É um paradigma para o estudo da caridade. Nela, um homem que
descia de Jerusalém para Jericó, caiu nas mãos de ladrões que o despojaram,
cobriram-no de feridas e se foram, deixando-o semimorto. Passaram pelo mesmo
caminho um sacerdote, um levita e um Samaritano. Os dois primeiros desviaram-se
do homem enfermo; o Samaritano, porém, foi tocado de compaixão, pensou-lhes as
feridas e o conduziu a uma hospedaria. Nesta passagem, Jesus quis nos mostrar
que a prática da caridade não está atrelada a religião, mas pertence ao íntimo
do ser, pois o Samaritano, que era considerado herege mostrou-se mais caridoso
do que aqueles que tinham o conhecimento da religião organizada. 6.2. FAZER AO OUTRO O QUE GOSTARÍAMOS QUE NOS FIZESSE Esta frase tem cunho de uma ordem. Ela está ligada a uma
outra que diz: "Amai ao próximo como a si mesmo". Quer dizer, o outro é o nosso
próximo e o próximo mais próximo é o nosso familiar, aquele que convive conosco,
sob o nosso teto. Caso vivamos sozinhos, o nosso próximo passa a ser o que
convive conosco no trabalho, na empresa, ou na igreja que freqüentamos. De modo
que em toda a ocasião de nos relacionarmos com o próximo, podemos por em pratica
esses ensinamentos. É preciso, pois, penetrar na sua profundidade, ou seja, dar
ao outro o que ele precisa e não aquilo que nos sobra, que está nos
atrapalhando. É o caso de desfazermos de alguns bens para o auxilio ao próximo.
Damos coisas sujas, roupas que não terão mais uso, roupas que deverão ir para o
lixo. 6.3. O PROBLEMA DIFÍCIL O mais intricado problema do mundo é o de cada homem cuidar
dos próprios negócios, sem intrometer-se nas atividades alheias. Para ilustrar esta tese, o Espírito Néio Lúcio conta a
história de um sábio e as ordens dadas aos seus três filhos, em razão da
discussão sobre o problema mais difícil para alcançar o progresso espiritual. O
pai, para tornar prático o ensinamento, propõe-lhes a tarefa de levar algumas
dádivas ao palácio do príncipe governante: o primeiro seria o portador de rico
vaso de argila preciosa; o segundo levaria uma corça rara; o terceiro
transportaria um bolo primoroso da família. No caminho, cada irmão ficou preocupado com a tarefa do
outro. Assim, O que carregava a corça, preocupado com o condutor do vaso,
descuida da própria tarefa e tenta ajudar a posição do vaso. Com isso, o vaso
cai e quebra-se. Com o choque, o condutor da corça perde o controle do animal,
que foge espantado. O carregador de bolo avança para sustar-lhe a fuga,
internando-se no mato e o bolo espatifa-se no chão. Desapontados, voltam à casa materna sem terem cumprido a
obrigação. O sábio disse-lhes: se cada um de vocês estivesse vigilante na
própria tarefa, não colheriam as sombras do fracasso. (Xavier, 1966, cap. 36) 7. CONCLUSÃO O eu não existe sem o outro. Tudo o que fazemos, por mais
insignificante que seja, é sempre direcionado ao outro. Mesmo o maior dos
egoístas, quando desencarna a sua riqueza a sua herança vai para as mãos de seus
descendentes. 8. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ARDUINI, Juvenal. Antropologia:
Ousar para Reinventar a Humanidade. São Paulo: Paulus, 2002. (Coleção estudos
antropológicos) XAVIER, F. C. Jesus no Lar,
pelo Espírito Néio Lúcio. 5. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1966.
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