Bismael B. Moraes (*)
Introdução
Como o Espiritismo é a doutrina da fé raciocinada (não apenas decorada e repetida) e cada espírita é um trabalhador da última hora, e nós, seres humanos, somos dotados de livre-arbítrio por Deus (causa primária de todas as coisas e inteligência suprema), não devemos bater palmas para os algozes e nos omitir em questões fundamentais para o progresso de todos; temos que evitar o crescimento do mal ante a ausência do bem.
Assim, quando muitos, por interesses escusos ou por ignorância, ainda defendem o “dente por dente, olho por olho”, ou a pena de morte, ou a prisão perpétua, ou os castigos corporais, ou, anestesiados pela mídia ou pela retórica dos oportunistas, pretendem dar aval à diminuição da idade penal – de 18 para 16 anos -, devemos estar alertas (“orar e vigiar”, como ensinou o Cristo), ponderando, acreditando e aconselhando que o amor, a escola e o trabalho digno representam o tripé para a harmonia e o progresso, antídoto para todas as enfermidades sociais.
O legislador humano e a obra silenciosa dos bons espíritos
Se folhearmos o livro “Direito e Espiritismo” (Edição AJE/SP, SP, 2010), coordenado pelo Promotor de Justiça Thiago Cintra Essado e composto por trabalhos de vários autores, podemos ler o artigo “A legislação humana e o progresso da humanidade”, de Eduardo F. Valério, membro do Ministério Público do Estado de São Paulo, também um estudioso da Doutrina Espírita, que, na página 57, citando Allan Kardec, registra: “O egoísmo humano criou direitos e deveres imaginários, contra a lei natural, que tendem a desaparecer. As leis humanas, em geral, estão a serviço de interesses pessoais ou de grupos políticos e econômicos fortes, revelando um vacilante sentimento de certo e errado. (...) É que esse processo de elaboração das leis humanas sempre obedeceu a um critério reitor: legisla quem manda”.
Por outro lado, se bem observarmos, verificaremos que uma legião de bons espíritos estão sempre procurando auxiliar os seres humanos, inspirando-os, silenciosamente, para atos corretos. Observe-se que o legislador constituinte brasileiro, na Constituição Federal de 1988, estabeleceu, no artigo 228, que os menores de 18 anos são inimputáveis e sujeitam-se às normas da legislação especial, motivo pelo qual o Código Penal, em seu artigo 27, é textual: “Os menores de 18 anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial”. E essa legislação, de que falam a Constituição Federal e o Código Penal Brasileiro, é, atualmente, o ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8069, de 13/07/1999).
Adolescente como criminoso e manchetes rentáveis
O menor de 18 anos, nos termos do ECA, em caso de conduta descrita como infração penal, não pratica crime e sim ato infracional. Aliás, o ECA é reconhecido por todos os juristas sérios como uma das leis mais atualizadas quanto às medidas de proteção, sócio-educativas e de garantias individuais dos adolescentes. Na verdade, o que falta são pessoas convenientemente preparadas e estabelecimentos adequados para as tarefas a serem realizadas com os jovens recolhidos. Por isso, os infratores adolescentes, quase sempre, vêm sendo tratados como criminosos comuns. Assim, quando o próprio Estado, por suas autoridades, falha na parte que lhe toca, não realizando a prevenção criminal, nem cuidando do adolescente infrator antes que ele se desvie dos procedimentos socialmente aceitáveis, não se justifica que, insuflado pela mídia, venha a propor a diminuição da idade penal de 18 para 16 anos!
O que vem ocorrendo, em regra, é que as inúmeras carências – familiar, escolar, administrativa, político-governamental – levam a grossa massa de adolescentes à prática de atos infracionais. Os insensíveis, aos quais, ao que parece, falta a caridade cristã (como se não tivessem filhos, netos, sobrinhos e irmãos em idade de risco), costumam dizer: “Esses pequenos bandidos precisam atingir logo 18 anos ou serem apenados aos 16 ou até aos 14...Se não forem mortos pela polícia ou pelos justiceiros de aluguel, já atingiram a maioridade penal e merecem cadeia”, Para vários desses espíritos vingativos, que assim falam, os adolescentes, representando o terror para os “cidadãos de bem”, acham-se prontos para, de cabeça vazia, de barriga vazia, de mãos algemadas e sem perspectivas, enfrentar autoridades públicas - o Delegado de Polícia (que os indicia criminalmente), o Promotor de Justiça (que os denuncia formalmente) e o Juiz de Direito (que os condena penalmente) - para que se faça “justiça”, aumentando as estatísticas , sobressaindo manchetes dos jornais e noticiários da TV, crescendo o medo no seio do povo e enchendo os bolsos dos “espertos”, que lucram com a insegurança pública!
Os verdadeiros espíritas
Como espíritas, tendo muitas vidas pela frente e conhecendo a lei natural de ação e reação (que o ser humano não cria nem revoga), não podemos defender a redução da idade penal para 16 anos, porque todos nós temos filhos, netos, sobrinhos e irmãos adolescentes, e não desejamos que eles façam parte de eventuais estatísticas criminais. Por isso, devemos “orar e vigiar” (como ensinou o Cristo), em defesa das vítimas e dos adolescentes desviados ou desamparados, para não engrossar acrítica dos que, embora se dizendo “cristãos” e “religiosos”, pretendem defender a vingança em lugar da justiça, sem pensar na responsabilidade moral que todos temos, não somente perante as leis humanas, mas, e principalmente, perante a Lei Natural (de ação e reação), ou Lei Divina, ou Lei de Deus!
(*) Bismael B. Moraes, advogado, Mestre em Direito Processual pela USP, ex-Presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo, pertence à UDEsp – União dos Delegados Espíritas -, autor de 19 livros e mais de 400 artigos, é comunicador da Radio Boa Nova – 1450 AM (5ª feira, das 12 às 13 e das 14:30 às 15:00 horas).
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