Sérgio Biagi Gregório
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Conceito. 3. A felicidade no
Tempo. 4. Problema da Felicidade: 4.1. Bem Procurado por todos os Viventes; 4.2.
Os Caminhos Procurados; 4.3. Paradoxo da Felicidade. 5. Situação do Planeta
Terra: 5.1. Mundo de Provas e Expiações; 5.2. O Necessário e o Supérfluo; 5.3.
Tanto o Rico quanto o Pobre Sofrem. 6. Despojar-se do Homem Velho: 6.1.
Sofreremos Perseguições e Sarcasmos; 6.2. Felicidade e Infelicidade Relativas;
6.3. A Boa Consciência Prepara uma Vida Futura Feliz. 7. Conclusão. 8.
Bibliografia Consultada. 1. INTRODUÇÃO O objetivo deste estudo é verificar por que Allan Kardec, em
O Evangelho Segundo o Espiritismo, diz que a felicidade não é deste
mundo. O que se entende por felicidade? Se a felicidade não é deste mundo,
devemos esperar o desencarne para usufruí-la? Não é possível desfrutá-la já?
Como proceder para buscar a paz de espírito? Eis algumas das muitas questões que
poderíamos formular sobre o tema. 2. CONCEITO Felicidade
– do latim felicitas que vem de
Felix, ditoso, afortunado, feliz. Num sentido amplo é a ausência de todo o
mal, e, vivência plena do bem. Em geral, um estado de satisfação devido à
própria situação do mundo. Por essa relação com a situação, a noção de
felicidade difere da de beatitude a qual é o ideal de uma satisfação
independente da relação do homem com o mundo e por isso limitada à esfera
contemplativa ou religiosa. O conceito de felicidade é humano e mundano. (Abbagnano,
1970) Mundo – o Planeta Terra (...) Cada mundo é um vasto anfiteatro composto de inúmeras
arquibancadas, ocupadas por outras tantas séries de seres mais ou menos
perfeitos. E, por sua vez, cada mundo não é mais do que uma arquibancada desse
anfiteatro imenso, infinito, que se chama Universo. Nesses mundos, nascem,
vivem, morrem seres que, pela sua relativa perfeição, correspondem à estância
mais ou menos feliz que lhes é destinada. (Equipe da FEB, 1995) 3. A FELICIDADE NO TEMPO Para Sócrates o "conhece-te a ti mesmo" é a chave para
a conquista da felicidade. Para Platão a noção de felicidade é relativa à
situação do homem no mundo, e aos deveres que aqui lhe cabem. Para
Aristóteles a felicidade é mais acessível ao sábio que mais facilmente basta
a si mesmo, mas é aquilo que, na realidade, devem tender todos os homens da
cidade. No âmbito do Velho Testamento, a felicidade centra-se na
aquisição dos bens mais elementares como comer, beber e viver em família e no
temor a Iahweh, que eqüivale à atitude religiosa do homem. Na dimensão do
Novo Testamento, a felicidade está nas bem-aventuranças prometidas por
Jesus. Plotino (204-270) afirma que a felicidade do sábio não
pode ser destruída nem pelas circunstâncias adversas nem pelas favoráveis.
Santo Agostinho (354-430) entende a felicidade como o fim da sabedoria, a
posse do verdadeiro absoluto, isto é, de Deus. Tomás de Aquino
(1225-1274), na Suma Teológica, utilizou a palavra "beatitude" como
equivalente à "felicidade" e a definiu como "um bem perfeito de natureza
intelectual". Kant (1724-1804) julga que a felicidade faz parte do bem
supremo o qual é para o homem a síntese de virtude e felicidade. Bentham
(1748-1832) e Stuart Mill ( 1773-1836) retomaram como fundamento de moral
a fórmula de Beccaria: "A maior felicidade possível, no maior número de
pessoas". (Abbagnano, 1970) Este escorço histórico culmina com a nossa época atual em que
os valores legítimos da verdadeira felicidade estão ameaçados pelo consumismo
e globalização do mundo econômico. A globalização traz a padronização
em termos mundiais, nem sempre factível com os hábitos culturais de determinados
países. O consumismo faz com que o homem tenha necessidades imaginárias que mais
atrapalham do que o auxiliam a realizar-se plenamente. 4. PROBLEMA DA FELICIDADE 4.1. BEM PROCURADO POR TODOS OS VIVENTES A ausência de todo o mal e fruição de todo o bem é a
aspiração que todo ser humano procura através de seus esforços e trabalhos. Ela
é o pólo oculto que magnetiza o dinamismo humano. Toda ação humana, mesmo os
gestos mais simples, são atravessados por esse magnetismo. Se este cessasse, o
homem perderia o sentido de viver e seria prostrado pelo tédio. Assim, todo o
homem tem na vida momentos de felicidade e gostaria que esses momentos nunca
mais acabassem. 4.2. OS CAMINHOS PROCURADOS Todos buscam a felicidade, porém por caminhos diferentes. Uns
imaginam encontrá-la na posse das riquezas, porque supõem que com o dinheiro
tudo se compra e que a felicidade é uma mercadoria como tantas outras. Outros
procuram encontrá-la nos prazeres sexuais, nas diversões, nos passeios. Outros
ainda na glutonaria. Há também os que anseiam pelo prestígio, enovelando-se nas
lutas pelo poder. Observe que os Estatolatras (comunistas, socialistas,
fascistas), colocam a felicidade na classe ou no Estado, ou na prosperidade
econômica. Karl Marx, filósofo materialista, afirma que a felicidade do ser
humano está presa aos proventos materiais advindos do trabalho. Confunde o termo
felicidade com o bem-estar. O bem-estar é a posse de bens materiais, que dão
mais conforto; a felicidade é mais ampla, porque envolve a realização do ser
espiritual. 4.3. PARADOXO DA FELICIDADE O fato mais confirmado pela experiência e pela sabedoria
humana é este: a felicidade, no seu sentido pleno, é inatingível na Terra. O
corriqueiro é que o ser humano, depois de muito lutar para conseguir um bem que
almejava, já não está tão vigoroso para desfrutá-lo. Além disso, há que se
considerar a decorrência do tempo na modificação de nossos ideais. Aí está o
paradoxo: ela é sempre desejada e nunca realizável. No âmago deste paradoxo há
algo positivo, ou seja, o começo de uma reflexão sobre o destino transcendental, meta-histórico do homem. É a partir daí que o homem começa a pensar numa vida
futura, num mundo cheio de bem-aventuranças, de beatitudes. (Pequena
Enciclopédia de Moral e Civismo) 5. SITUAÇÃO DO PLANETA TERRA 5.1. MUNDO DE PROVAS E EXPIAÇÕES Os amigos espirituais informam-nos de que o nosso planeta não
é um dos orbes mais evoluídos do Universo. Ele já esteve mais atrasado, pois já
ultrapassou o estado primitivo. Na atualidade, estamos vivendo num mundo de
provas e expiações em que o mal ainda predomina sobre o bem. Nesse sentido, por
mais que busquemos a felicidade, nunca a encontraremos, pois ela não é deste
mundo. Ela pertence a um mundo mais evoluído em que as ações voltadas para a
fraternidade universal são a regra. De qualquer forma, devemos fazer esforços
para evoluir, a fim de atingir a condição de habitar mundos melhores. Por
enquanto, somos obrigados a conviver com toda a sorte de dificuldades. 5.2. O NECESSÁRIO E O SUPÉRFLUO Como distinguir entre o necessário e o supérfluo? Não é
tarefa fácil. Imagine alguém que tenha vivido, por longos anos, com uma renda
monetária alta. Nessa condição, ele aprendeu a conviver com uma série de hábitos
de consumo, que para ele se tornou imprescindível. Suponhamos agora que, por
obra do destino, os ganhos desse indivíduo tenham diminuído drasticamente: ele
se sentirá o mais desgraçado dos mortais, embora tenha o necessário para viver.
Quer dizer, acabamos confundindo o necessário, aquilo que dá sustentação à nossa
vida, com os aspectos psicológicos de nossa existência. Nesse mister, os grandes
mestres da humanidade ensinam-nos que o homem cósmico terá sempre o que
necessita, mas nem sempre o que deseja. Faltando-nos o supérfluo, lembremo-nos
da frase consoladora do evangelho: "Tendo sustento e com o que nos cobrirmos,
estejamos com isso contentes". 5.3. TANTO O RICO QUANTO O POBRE SOFREM Como vimos anteriormente, o nosso planeta identifica-se com a
categoria de mundo de provas e expiações. Assim, não há criatura na Terra que
não tenha o seu quinhão de sofrimento. Deduz-se daí que tanto o rico como os
pobres sofrem. Mas, o Espiritismo, doutrina que esclarece sobre a reencarnação e
a pluralidade das existências, pode oferecer-nos valiosos subsídios para a
compreensão da vida e dos seus diversos relacionamentos. Por que o pobre inveja
o rico? Sabe ele que a prova da riqueza é mais difícil, para o Espírito, do que
prova da pobreza? Se tivesse consciência dessa verdade, com certeza seria mais
resignado. 6. DESPOJAR-SE DO HOMEM VELHO 6.1. SOFREREMOS PERSEGUIÇÕES E SARCASMOS Quando o aprendiz do evangelho realmente persevera na sua
trajetória rumo à verticalidade superior, começa a observar uma série de
problemas que antes não vislumbrava: a solidão dentro e fora de si, o desprezo
dos entes queridos e a incompreensão alheia. Para abrandar este estado de
espírito, convém nos lembrarmos dos sofrimentos de Paulo, principalmente depois
de ter aderido, no caminho de Damasco, ao chamamento de Cristo. De perseguidor
passa a ser perseguido. Os seus familiares e amigos voltam-lhe as costas dizendo
que ficara louco. É obrigado a se ausentar, recolhendo-se ao tear por 3 anos.
Posteriormente, para tornar público o ensinamento do Evangelho, viu-se cercado
por uma série de contratempos, que não havia previsto. Mesmo assim continuou na
sua tarefa redentora. Baseado nesse exemplo, devemos ter coragem de expressar
nossa fé, porque retroceder no meio do caminho é perder todas as vantagens já
conquistadas. Jesus disse: "Todo aquele que me confessar e me reconhecer diante
dos homens, eu o reconhecerei e confessarei também, eu mesmo, diante de meu Pai
que está nos céus; e todo aquele que me renegar diante dos homens, eu o
renegarei também, eu mesmo, diante do meu Pai que está nos céus". (Mateus, X, 32
e 33). Quer dizer, há sempre fraqueza em recuar diante das conseqüências da
opinião e em renegá-la, mas há casos de uma covardia tão grande quanto a de
fugir no momento do combate. 6.2. FELICIDADE E INFELICIDADE RELATIVAS Na condição de Espírito encarnado, deveríamos nos considerar
como um usufrutuário de todos os bens dispostos por Deus, inclusive o nosso
próprio corpo, pois, embora seja fruto da união do nosso pai e da nossa mãe
terrestre, a essência que nele habita pertence ao Criador do Universo.
Raciocinando dessa forma, o egoísmo deveria ser banido do nosso planeta, a fim
de ceder o seu espaço à fraternidade. Pergunta-se: será que podemos ser felizes ao lado de irmãos
que não têm o necessário para o sustento físico? E por que esses são a maioria?
É justamente devido à condição de nosso Planeta. Nesse sentido, nunca poderemos
ter uma felicidade plena, a menos que não importemos com o nosso irmão menos
aquinhoado. Quem pensa no irmão em dificuldade, dificilmente sentir-se-á feliz.
É por isso que o justo é infeliz, pois lutando por uma distribuição mais justa
tanto das riquezas materiais como espirituais, será sempre mal compreendido,
além de ser desprezado, como o próprio Jesus e outros tantos missionários o
foram. Quais seriam, entretanto, as fontes de infelicidade?
Perda de entes queridos, mortes prematuras, antipatias, ingratidão e doenças
várias. Dentre elas, a ingratidão assume papel significante. Como, porém,
enfrentar essa situação? Lembrando-nos de que a ingratidão é filha do egoísmo e
o egoísta encontrará mais tarde corações insensíveis como ele próprio o foi.
Além do mais, a ingratidão é uma prova para persistência na prática do bem.
Convém ter para com eles muita tolerância e paciência, assim como o Pai
Celestial teve e está tendo para conosco. 6.3. A BOA CONSCIÊNCIA PREPARA UMA VIDA FUTURA FELIZ "O que dá mais valor ao homem é um juízo sereno e uma firme
capacidade de trabalho". Juízo sereno é sinônimo de pureza de consciência. Tendo
esta em plenitude, não importa onde estivermos, estaremos sempre usufruindo a
felicidade relativa de que somos merecedores. Os amigos espirituais não nos
cansam de ensinar que a nossa felicidade será do tamanho da felicidade que
proporcionarmos ao nosso próximo. Esforcemo-nos, então, para distribuir bom
ânimo aos nossos companheiros de jornada. Esta é uma boa fórmula para
prepararmos um desencarne tranqüilo e, conseqüentemente, uma vida futura feliz.
7. CONCLUSÃO A máxima do Eclesiastes, "A felicidade não é deste mundo",
pode ser entendida de duas maneiras: 1) que há outros mundos mais evoluídos do
que o Planeta Terra, onde a felicidade é mais plena; 2) que a felicidade não
estando no mundo material, pode ser encontrada no mundo interior, como
conseqüência do dever retamente cumprido. 8. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ABBAGNANO, N. Dicionário de Filosofia. São Paulo,
Mestre Jou, 1970. São Paulo, outubro de 1996.
ÁVILA, F. B. de S.J. Pequena Enciclopédia de Moral e Civismo. Rio de
Janeiro: M.E.C., 1967.
IDÍGORAS, J. L., Padre, S. j. Vocabulário Teológico para a América Latina.
São Paulo, Edições Paulinas, 1983.
KARDEC, A. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 39. ed. São Paulo: IDE,
1984.
KARDEC, A. O Livro dos Espíritos. 8. ed. São Paulo: Feesp, 1995.
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